No evangelho de Lucas, Jesus sofre a última tentação de Jesus no templo de Jerusalém. Para o evangelista, a Cidade Santa é o centro da história da salvação e o ponto de convergência das atividades de Jesus, onde Ele triunfa em sua provação decisiva: a paixão (cf. Lc 22,3.53).
Na tradição bíblica, tentação não é, de per si, instigação ao mal, mas uma experiência inevitável na vida de toda pessoa, na qual ocorre uma avaliação da própria identidade e das próprias opções. Em relação ao povo de Israel, tal experiência é expressa nos seguintes termos: “Lembra-te de todo o caminho que o Senhor teu Deus te fez percorrer durante quarenta anos no deserto, a fim de humilhar-te e pôr-te à prova para saber o que tinhas no coração: se observarias ou não seus mandamentos” (Dt 8,2).
Como outrora o seu povo, também Jesus, após o batismo, é conduzido pelo Espírito ao deserto para ser testado. De início, Satanás põe em dúvida Sua filiação divina, proclamada pela voz celeste, no momento do batismo (cf. Lc 3,22), provocando Jesus a demonstrá-la transformando a pedra em pão, para saciar sua fome. Com a expressão: “Não só de pão vive o homem”, Jesus rechaçou o tentador. Sem negar as urgências humanas reais, Ele testemunha que só Deus é o verdadeiro sustento do fiel, e que nem mesmo as necessidades substanciais, como o pão de cada dia, podem tomar o lugar d’Ele em nossa vida.
Na segunda tentação, Satanás oferece a Jesus o esplendor de todos os reinos terra em troca de sua adoração. Sem prender-se a detalhes, Lucas sintetiza o conteúdo da sedução diabólica: todo discípulo de Jesus está sujeito ao perigo de ceder à ganância de poder e de riqueza, que contraria o espírito de serviço, princípio vital do Mestre, sacramentado na Última Ceia (cf. Lc 22,24-27). Jesus rechaçou o ataque diabólico com as palavras: “Adorarás o Senhor teu Deus e só a ele servirás” (Dt 6,13), que retomam o conteúdo essencial do Shemá (cf. Dt 6,4), a oração diária de todo fiel judeu. Com isso, o evangelista afirma que, na luta inevitável contra o mal, o cristão deve buscar força na oração cotidiana.
A ambientação no templo e a citação do Salmo, confere à terceira tentação um caráter religioso. Do cimo do templo, Satanás instiga Jesus a lançar-se abaixo, valendo-se de palavras literais do Salmo, que asseguram a assistência de Deus aos que nele confiam (Sl 91,11-12). Com as palavras bíblicas: “Não tentarás o Senhor teu Deus! (Dt 6,16), Jesus repele o tentador. Não faz sentido uma religião que instrumentaliza Deus, pretendendo usá-lo a bel prazer. A palavra revelada não pode ser utilizada para o próprio uso e consumo. Pretender sujeitar Deus às próprias necessidades e interesses é diabólico.
Didaticamente narradas como se tivessem acontecidas num momento especial, na verdade, as tentações sempre estiveram presentes na vida de Jesus. Portanto, esta página é uma referência imprescindível para a comunidade cristã em seu caminho discipular. A proximidade com Deus, cultivada mediante a escuta obediente da Palavra e da oração constante, à semelhança de Jesus, é trunfo eficaz do fiel em seus embates com as provações.
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